Nos dias que correm, o ideal de beleza é algo com o qual somos praticamente obrigados a conviver todos os dias. Filmes, publicidade, revistas, entre muitos outros meios apresentam constantemente corpos magros e esbeltos. Como todos sabemos, antigamente, a célebre frase “gordura é formosura” traduzia o ideal representado em muitas pinturas onde vemos mulheres com ancas largas e formas arredondadas. Na actualidade, as mulheres intituladas modelos são cada vez mais magras. Um exemplo disso é a recentemente nomeada Miss Austrália (http://jn.sapo.pt/paginainicial/interior.aspx?content_id=1210336) que veio levantar opiniões contraditórias, devido às suas características - tem 19 anos, mede 1,80m e pesa 49 Kg. A presidente da associação de médicos da Austrália terá mesmo afirmado que "a parte menos saudável disto tudo é que a imagem que está ser mostrada para outras jovens é de que isso é normal, quando claramente não é."
A partir do tema proposto pela telenovela “Yo Soy Betty, La Fea”, iremos abordar os estereótipos de beleza, relacionando-os com o que está presente na publicidade, no filme “Real Women Have Curves” assim como em “The Devil Wears Prada”.
Mesmo havendo variadas versões, todos conhecemos a famosa Ugly Betty, onde o tema da beleza é abordado de uma forma crítica, mas humorística. “Betty La Fea” foi a primeira versão apresentada, sendo esta uma telenovela colombiana, realizada entre 1999 e 2001, que se centra no mundo da moda e nos estereótipos que vêm com esse mundo, onde o ideal de beleza é representado. Betty é a personagem principal desta telenovela que, como o nome indica, vai contra todos os modelos de beleza exigidos pela moda. Mas, mesmo usando roupas extravagantes, óculos de lentes grossas e aparelho nos dentes, características que lhe dão uma aparência peculiar, esta personagem ingressa no mundo da moda, trabalhando numa revista onde todos os outros têm os requisitos de beleza padronizados por esta indústria. Desta forma, Betty não é considerada uma mulher atraente como todas as outras no seu local de trabalho, o que leva a muitos comentários de mau gosto, com os quais esta se depara todos os dias. É disso exemplo, na versão colombiana, o comentário de Marcela, a filha do co-fundador da companhia de moda e noiva do presidente, quando argumenta que um presidente tão prestigiado no mundo da moda não podia ter de maneira alguma uma secretária como Betty. Aliás, o seu currículo só foi tido em conta por não ter a sua fotografia. Mesmo assim, esta é contratada e todos os dias sofre com os insultos e piadas que lhe são dirigidas, não sendo a única a sofrer estes desaforos, pelo que se apoia no seu novo grupo de amigas intituladas “O grupo das Feias”.
Nesta telenovela, podemos aperceber-nos de que nos dias de hoje, muitas pessoas são pressionadas devido ao seu aspecto e aos estereótipos que a sociedade promove. De certa forma, a própria telenovela vai-se rendendo a estes estereótipos que supostamente está a tentar combater de forma a abrir a mente das pessoas, pois no seu final a actriz principal torna-se bonita como todas as outras. Podemos então dizer que, por muito que se tente lutar e mudar as mentes actuais, o que está à nossa volta tende a não permitir essa mudança na totalidade, havendo, no entanto, por vezes quem tente mudar os ideais implementados, como por exemplo através da própria publicidade.
Actualmente, somos bombardeados por imagens que pretendem representar o ideal de beleza, criando a ideia de que todas as mulheres a podem alcançar, bastando para isso usarem/consumirem os produtos publicitados. A indústria dos cosméticos e do vestuário recorre a representações de mulheres jovens, magras, de peito e nádegas preponderantes, de pele sem qualquer defeito e cabelos brilhantes e sedosos. Quem são estes seres cujas proporções e atributos desafiam em geral as leis naturais? Qual o efeito destas representações na sociedade actual?
Não é coincidência os casos de distúrbios alimentares serem hoje cada vez mais numerosos e culminarem em situações cada vez mais extremas. Paralelamente à difusão das imagens acima referidas, aumenta o número de produtos milagrosos que prometem ajudar a mulher a alcançar o objectivo da perfeição utópica. Estas imagens cercam-nos e começam a influenciar-nos desde cedo. Ao ligarmos a televisão, ao passearmos na rua, ao vermos videoclips e até mesmo desenhos animados, o ideal feminino (e não apenas o de beleza física, mas o do próprio comportamento) está sempre presente.
É neste ambiente distorcido que, em 2004, a marca Dove inicia o lançamento da “Campanha pela Beleza Real”. Nesta estratégia publicitária para um creme reafirmante, foram escolhidas “mulheres reais” e não modelos. Esta marca inicia assim uma campanha na defesa de uma beleza real e natural, salientando que deve ser pela valorização das suas diferentes características físicas, que a mulher deve avaliar a sua beleza, e não pela tentativa de aproximar a sua imagem dos arquétipos irrealistas que desfilam nas passerelles. A mensagem dos anúncios principais é a de que as mulheres reais têm curvas, cabelos brancos, sardas, … No âmbito desta campanha a Dove lançou também um site (www.campaignforrealbeauty.com), iniciou um fundo para a auto-estima e uma série de spots publicitários/curtas-metragens que alertam principalmente para os perigos a que as jovens mulheres, desde crianças, estão sujeitas. Os filmes “Evolução” (a criação de uma modelo fotográfica)e Amy (que evidencia a insegurança infligida nas adolescentes) mostram como a nossa visão da realidade pode ser distorcida. “Filhas” e “Sob Pressão”, com o slogan “Fale com ela, antes que a indústria da beleza o faça por si.”, reflectem o espírito desta campanha, que se preocupa também com os efeitos negativos deste género de publicidade nas adolescentes. Além de um site com actividades dirigidas a diferentes faxas etárias, envolve também um conjunto de workshops que pretendem ajudar a construir e proteger a auto-estima feminina. Um estudo (Only Two Percent of Woman Describe Themselves as Beautiful: New Global Study Uncovers Desire for Broader Definition of Beauty.In http://www.campaignforrealbeauty.com/press.asp?section=news&id=110) realizado por esta empresa – cujos resultados foram utilizados para a própria campanha publicitária – apurou, entre outros aspectos, que apenas 2% das mulheres se descreviam a elas próprias como bonitas, 63% concordavam que a sociedade espera que as mulheres melhorem a sua aparência física e 75% desejavam que os media representassem mulheres de atractividade física variada, incluindo idade, forma e tamanho.
Verificamos então que esta marca (fabricante de produtos de beleza) defende o direito das mulheres se preocuparem com o seu aspecto físico, mas sem se auto- destruírem numa corrida pela beleza utópica. Promove antes a auto-apreciação, o gosto pelo seu próprio corpo, pelas suas idiossincrasias físicas, tirando partido dessas mesmas e cuidando de si. A Dove rompe assim com os estereótipos de beleza feminina, provocando os seus consumidores com perguntas como “fat or fab?”, “Grey or Gorgeous” e “Ugly spots or Beauty spots?”, culminando com “Curvy thighs, rounder hips, bigger bums. We couldn’t have wished for better models to test our firming lotion” e “New Dove Firming. As tested on real curves.”. Não nos podemos esquecer de que se trata de uma campanha publicitária cujo objectivo principal é – ainda que integre outros mais nobres – vender o produto. No entanto, é de louvar a mudança de abordagem desta questão: não prometem uma beleza inacessível, mas sim a possibilidade de realçar o que cada mulher tem de melhor.
Ainda no campo publicitário, há outro uso da figura feminina que ultrapassa todos os conceitos de respeito pela mulher. Referimo-nos à utilização da figura da mulher como objecto de marketing associada a produtos que nem sequer são dirigidos à mulher enquanto consumidora. Pelo contrário, nestas situações assistimos à exploração da imagem feminina, na maioria das vezes transmitida como objecto sexual para atrair o sexo oposto para os produtos publicitados. Deparamo-nos assim com imagens de mulheres em poses provocatórias envolvendo bebidas alcoólicas, carros ou perfumes para homem. O que poderá significar tudo isto? A permanência de uma tendência machista da sociedade em que vivemos? Ou uma tendência para a desumanização? Segundo Jean Kilbourne, “transformar um ser humano numa coisa é quase sempre o primeiro passo para justificar violência contra essa pessoa.” “Claramente, a construção da masculinidade envolve a (…) difamação das mulheres como objectos sexuais, mantendo a superioridade sexual masculina.” (Hood, 1995. In http://www.youtube.com/watch?v=WgGiB-o84sk) Esta “divisão do mundo no reino simbólico de cultura masculina e o reino da doméstica feminina deixa a mulher como intelectualmente inferior.” (In http://www.youtube.com/watch?v=WgGiB-o84sk) No entanto, esta tendência para manter a mulher associada a determinadas actividades domésticas ou à maternidade está hoje a mudar, aparecendo já alguns anúncios em que esses papéis são ocupados por homens, acompanhando a evolução da própria sociedade. Todavia, a beleza utópica está sempre presente, agora não só na figura feminina, mas também na masculina.
Outro exemplo de negação do ideal de beleza que nos é imposto diariamente, através das mais variadas formas, é o filme “Real Women Have Curves”. Este filme, protagonizado por America Ferrera - que, curiosamente, também tem o papel principal na versão americana da série “Betty Feia” -, fala-nos da vida de Ana, uma jovem latino-americana que, ao acabar o ensino secundário, luta contra o modelo de mulher imposto pela sua mãe, Carmen, segundo o qual “está na idade de trabalhar, casar e ter filhos”. Assim, Ana acaba por ajudar a irmã na sua fábrica têxtil e quase desiste do seu sonho de seguir os estudos. No entanto, devido ao apoio do seu professor e do relacionamento que tem com um colega de escola, Ana percebe que não se pode dar por vencida. Assim, mesmo quando é chamada à atenção devido ao seu peso e alertada de que este não servirá para “atrair” um marido, defende que a sua aparência e o estereótipo de que é alvo não demonstra de todo quem é.
Este filme evidencia uma mentalidade fechada e conservadora, que se torna problemática, mesmo nos nossos dias. De facto, durante o filme podemos ver o ideal de beleza que é imposto por Carmen. Quando Ana se revela contra a sua mãe dentro da fábrica e tira a roupa, seguida por Estella, sua irmã, e pelas suas costureiras, Carmen recusa-se a segui-las e acusa-as de “não terem vergonha”. Mas, de facto, vergonha de quê? De terem excesso de peso? De se mostrarem como são?
A ideia de beleza não como algo superficial mas como algo psicológico é acentuada por Jimmy, o colega de escola com quem Ana tem um relacionamento amoroso. Este diz-lhe que é “bonita independentemente do peso que tem e que este faz parte dela como um todo: como pessoa”.
Ao longo do filme, podemos fazer um paralelismo entre a rebeldia de Ana contra os estereótipos de que é alvo, aceitando o seu peso como algo natural. Por exemplo, quando a sua irmã percebe que Ana é capaz de ir além do que esta alguma vez foi, muda a opinião de que “nunca irá caber num vestido feito por ela” e faz-lhe um como forma de absolvição. Um outro exemplo é a atitude que Ana toma aquando da advertência de Carmen, num café: independentemente de a mãe a proibir, Ana dá uma dentada no pudim flan que esta comia. Estes pormenores do filme dão uma riqueza singular ao mesmo e, embora o seu final seja um tanto forçado no que conta ao típico final feliz de que todos estavam à espera desde o início – o que o torna um pouco previsível -, somos levados a sentirmo-nos orgulhosos em saber que Ana conseguiu ir mais longe e que, contra tudo e todos, a aparência nada demonstra do que realmente somos.
Infelizmente, hoje em dia, damos demasiada importância à aparência e deixamos de gostar de nós próprios por aquilo que somos. Gostamos daquilo que vemos como beleza idealizada e, muitas vezes, manipulada, quando o que realmente importa são as pessoas, enquanto um todo constituído pela aparência e pelo interior, em que este tem uma maior relevância para com quem lidamos diariamente. Infelizmente, devido à constante abordagem da publicidade e dos estereótipos de beleza, tendemos a esquecer a parte de nós que é mais importante.
“Um milhão de raparigas matava por esse trabalho”. “Mas eu não sou uma delas” é o que diz a personagem Andy Sachs no filme “The Devil Wears Prada”, de David Frankel. Tal como Betty, entrou no universo da moda sem ter nenhuma noção do que ele é. Andy adaptou-se lentamente e com esforço, e no fim, despede-se por se estar a tornar numa das “clakers”, as raparigas de tacão alto da revista em que trabalhava.
A obsessão das pessoas que trabalham no mundo da moda com seu peso está bem presente. As primeiras imagens que vemos são de mulheres a pesarem o pequeno-almoço. A primeira assistente da chefe da revista, está a fazer uma dieta que consiste em não comer e quando está quase a desmaiar, come um quadrado de queijo. Esta diz que para atingir o peso ideal “Só lhe falta uma complicação intestinal”.
Ao olharmos para Andy, vemos uma mulher com peso normal, mas para a moda ela é considerada praticamente obesa. Aliás, neste mundo “(...) o 2 tornou-se o novo 4 (...) e o 6 é o novo 14”. Os estereótipos da moda assim o exigem: para se ser bela, tem de se ser magra, sendo exemplo disso o caso referido no início deste post, a nova Miss Austrália. Mas, embora se pense o contrário, se perguntarmos a alguém do sexo masculino se o seu ideal é ou não o destas mulheres magras, se as acham ou não atraentes, veremos que as respostas não se encaixam neste “ideal” que a maioria das mulheres acha ser o desejável.
Como referido inicialmente, há muitos anos atrás, o ideal de beleza era o da mulher “cheiinha”. Será que esse conceito poderá regressar? Algo que pudéssemos denominar como o “ideal de uma beleza natural”. São de louvar as tentativas de mudança que estão a surgir.
A partir do tema proposto pela telenovela “Yo Soy Betty, La Fea”, iremos abordar os estereótipos de beleza, relacionando-os com o que está presente na publicidade, no filme “Real Women Have Curves” assim como em “The Devil Wears Prada”.
Mesmo havendo variadas versões, todos conhecemos a famosa Ugly Betty, onde o tema da beleza é abordado de uma forma crítica, mas humorística. “Betty La Fea” foi a primeira versão apresentada, sendo esta uma telenovela colombiana, realizada entre 1999 e 2001, que se centra no mundo da moda e nos estereótipos que vêm com esse mundo, onde o ideal de beleza é representado. Betty é a personagem principal desta telenovela que, como o nome indica, vai contra todos os modelos de beleza exigidos pela moda. Mas, mesmo usando roupas extravagantes, óculos de lentes grossas e aparelho nos dentes, características que lhe dão uma aparência peculiar, esta personagem ingressa no mundo da moda, trabalhando numa revista onde todos os outros têm os requisitos de beleza padronizados por esta indústria. Desta forma, Betty não é considerada uma mulher atraente como todas as outras no seu local de trabalho, o que leva a muitos comentários de mau gosto, com os quais esta se depara todos os dias. É disso exemplo, na versão colombiana, o comentário de Marcela, a filha do co-fundador da companhia de moda e noiva do presidente, quando argumenta que um presidente tão prestigiado no mundo da moda não podia ter de maneira alguma uma secretária como Betty. Aliás, o seu currículo só foi tido em conta por não ter a sua fotografia. Mesmo assim, esta é contratada e todos os dias sofre com os insultos e piadas que lhe são dirigidas, não sendo a única a sofrer estes desaforos, pelo que se apoia no seu novo grupo de amigas intituladas “O grupo das Feias”.
Nesta telenovela, podemos aperceber-nos de que nos dias de hoje, muitas pessoas são pressionadas devido ao seu aspecto e aos estereótipos que a sociedade promove. De certa forma, a própria telenovela vai-se rendendo a estes estereótipos que supostamente está a tentar combater de forma a abrir a mente das pessoas, pois no seu final a actriz principal torna-se bonita como todas as outras. Podemos então dizer que, por muito que se tente lutar e mudar as mentes actuais, o que está à nossa volta tende a não permitir essa mudança na totalidade, havendo, no entanto, por vezes quem tente mudar os ideais implementados, como por exemplo através da própria publicidade.
Actualmente, somos bombardeados por imagens que pretendem representar o ideal de beleza, criando a ideia de que todas as mulheres a podem alcançar, bastando para isso usarem/consumirem os produtos publicitados. A indústria dos cosméticos e do vestuário recorre a representações de mulheres jovens, magras, de peito e nádegas preponderantes, de pele sem qualquer defeito e cabelos brilhantes e sedosos. Quem são estes seres cujas proporções e atributos desafiam em geral as leis naturais? Qual o efeito destas representações na sociedade actual?
Não é coincidência os casos de distúrbios alimentares serem hoje cada vez mais numerosos e culminarem em situações cada vez mais extremas. Paralelamente à difusão das imagens acima referidas, aumenta o número de produtos milagrosos que prometem ajudar a mulher a alcançar o objectivo da perfeição utópica. Estas imagens cercam-nos e começam a influenciar-nos desde cedo. Ao ligarmos a televisão, ao passearmos na rua, ao vermos videoclips e até mesmo desenhos animados, o ideal feminino (e não apenas o de beleza física, mas o do próprio comportamento) está sempre presente.
É neste ambiente distorcido que, em 2004, a marca Dove inicia o lançamento da “Campanha pela Beleza Real”. Nesta estratégia publicitária para um creme reafirmante, foram escolhidas “mulheres reais” e não modelos. Esta marca inicia assim uma campanha na defesa de uma beleza real e natural, salientando que deve ser pela valorização das suas diferentes características físicas, que a mulher deve avaliar a sua beleza, e não pela tentativa de aproximar a sua imagem dos arquétipos irrealistas que desfilam nas passerelles. A mensagem dos anúncios principais é a de que as mulheres reais têm curvas, cabelos brancos, sardas, … No âmbito desta campanha a Dove lançou também um site (www.campaignforrealbeauty.com), iniciou um fundo para a auto-estima e uma série de spots publicitários/curtas-metragens que alertam principalmente para os perigos a que as jovens mulheres, desde crianças, estão sujeitas. Os filmes “Evolução” (a criação de uma modelo fotográfica)e Amy (que evidencia a insegurança infligida nas adolescentes) mostram como a nossa visão da realidade pode ser distorcida. “Filhas” e “Sob Pressão”, com o slogan “Fale com ela, antes que a indústria da beleza o faça por si.”, reflectem o espírito desta campanha, que se preocupa também com os efeitos negativos deste género de publicidade nas adolescentes. Além de um site com actividades dirigidas a diferentes faxas etárias, envolve também um conjunto de workshops que pretendem ajudar a construir e proteger a auto-estima feminina. Um estudo (Only Two Percent of Woman Describe Themselves as Beautiful: New Global Study Uncovers Desire for Broader Definition of Beauty.In http://www.campaignforrealbeauty.com/press.asp?section=news&id=110) realizado por esta empresa – cujos resultados foram utilizados para a própria campanha publicitária – apurou, entre outros aspectos, que apenas 2% das mulheres se descreviam a elas próprias como bonitas, 63% concordavam que a sociedade espera que as mulheres melhorem a sua aparência física e 75% desejavam que os media representassem mulheres de atractividade física variada, incluindo idade, forma e tamanho.
Verificamos então que esta marca (fabricante de produtos de beleza) defende o direito das mulheres se preocuparem com o seu aspecto físico, mas sem se auto- destruírem numa corrida pela beleza utópica. Promove antes a auto-apreciação, o gosto pelo seu próprio corpo, pelas suas idiossincrasias físicas, tirando partido dessas mesmas e cuidando de si. A Dove rompe assim com os estereótipos de beleza feminina, provocando os seus consumidores com perguntas como “fat or fab?”, “Grey or Gorgeous” e “Ugly spots or Beauty spots?”, culminando com “Curvy thighs, rounder hips, bigger bums. We couldn’t have wished for better models to test our firming lotion” e “New Dove Firming. As tested on real curves.”. Não nos podemos esquecer de que se trata de uma campanha publicitária cujo objectivo principal é – ainda que integre outros mais nobres – vender o produto. No entanto, é de louvar a mudança de abordagem desta questão: não prometem uma beleza inacessível, mas sim a possibilidade de realçar o que cada mulher tem de melhor.
Ainda no campo publicitário, há outro uso da figura feminina que ultrapassa todos os conceitos de respeito pela mulher. Referimo-nos à utilização da figura da mulher como objecto de marketing associada a produtos que nem sequer são dirigidos à mulher enquanto consumidora. Pelo contrário, nestas situações assistimos à exploração da imagem feminina, na maioria das vezes transmitida como objecto sexual para atrair o sexo oposto para os produtos publicitados. Deparamo-nos assim com imagens de mulheres em poses provocatórias envolvendo bebidas alcoólicas, carros ou perfumes para homem. O que poderá significar tudo isto? A permanência de uma tendência machista da sociedade em que vivemos? Ou uma tendência para a desumanização? Segundo Jean Kilbourne, “transformar um ser humano numa coisa é quase sempre o primeiro passo para justificar violência contra essa pessoa.” “Claramente, a construção da masculinidade envolve a (…) difamação das mulheres como objectos sexuais, mantendo a superioridade sexual masculina.” (Hood, 1995. In http://www.youtube.com/watch?v=WgGiB-o84sk) Esta “divisão do mundo no reino simbólico de cultura masculina e o reino da doméstica feminina deixa a mulher como intelectualmente inferior.” (In http://www.youtube.com/watch?v=WgGiB-o84sk) No entanto, esta tendência para manter a mulher associada a determinadas actividades domésticas ou à maternidade está hoje a mudar, aparecendo já alguns anúncios em que esses papéis são ocupados por homens, acompanhando a evolução da própria sociedade. Todavia, a beleza utópica está sempre presente, agora não só na figura feminina, mas também na masculina.
Outro exemplo de negação do ideal de beleza que nos é imposto diariamente, através das mais variadas formas, é o filme “Real Women Have Curves”. Este filme, protagonizado por America Ferrera - que, curiosamente, também tem o papel principal na versão americana da série “Betty Feia” -, fala-nos da vida de Ana, uma jovem latino-americana que, ao acabar o ensino secundário, luta contra o modelo de mulher imposto pela sua mãe, Carmen, segundo o qual “está na idade de trabalhar, casar e ter filhos”. Assim, Ana acaba por ajudar a irmã na sua fábrica têxtil e quase desiste do seu sonho de seguir os estudos. No entanto, devido ao apoio do seu professor e do relacionamento que tem com um colega de escola, Ana percebe que não se pode dar por vencida. Assim, mesmo quando é chamada à atenção devido ao seu peso e alertada de que este não servirá para “atrair” um marido, defende que a sua aparência e o estereótipo de que é alvo não demonstra de todo quem é.
Este filme evidencia uma mentalidade fechada e conservadora, que se torna problemática, mesmo nos nossos dias. De facto, durante o filme podemos ver o ideal de beleza que é imposto por Carmen. Quando Ana se revela contra a sua mãe dentro da fábrica e tira a roupa, seguida por Estella, sua irmã, e pelas suas costureiras, Carmen recusa-se a segui-las e acusa-as de “não terem vergonha”. Mas, de facto, vergonha de quê? De terem excesso de peso? De se mostrarem como são?
A ideia de beleza não como algo superficial mas como algo psicológico é acentuada por Jimmy, o colega de escola com quem Ana tem um relacionamento amoroso. Este diz-lhe que é “bonita independentemente do peso que tem e que este faz parte dela como um todo: como pessoa”.
Ao longo do filme, podemos fazer um paralelismo entre a rebeldia de Ana contra os estereótipos de que é alvo, aceitando o seu peso como algo natural. Por exemplo, quando a sua irmã percebe que Ana é capaz de ir além do que esta alguma vez foi, muda a opinião de que “nunca irá caber num vestido feito por ela” e faz-lhe um como forma de absolvição. Um outro exemplo é a atitude que Ana toma aquando da advertência de Carmen, num café: independentemente de a mãe a proibir, Ana dá uma dentada no pudim flan que esta comia. Estes pormenores do filme dão uma riqueza singular ao mesmo e, embora o seu final seja um tanto forçado no que conta ao típico final feliz de que todos estavam à espera desde o início – o que o torna um pouco previsível -, somos levados a sentirmo-nos orgulhosos em saber que Ana conseguiu ir mais longe e que, contra tudo e todos, a aparência nada demonstra do que realmente somos.
Infelizmente, hoje em dia, damos demasiada importância à aparência e deixamos de gostar de nós próprios por aquilo que somos. Gostamos daquilo que vemos como beleza idealizada e, muitas vezes, manipulada, quando o que realmente importa são as pessoas, enquanto um todo constituído pela aparência e pelo interior, em que este tem uma maior relevância para com quem lidamos diariamente. Infelizmente, devido à constante abordagem da publicidade e dos estereótipos de beleza, tendemos a esquecer a parte de nós que é mais importante.
“Um milhão de raparigas matava por esse trabalho”. “Mas eu não sou uma delas” é o que diz a personagem Andy Sachs no filme “The Devil Wears Prada”, de David Frankel. Tal como Betty, entrou no universo da moda sem ter nenhuma noção do que ele é. Andy adaptou-se lentamente e com esforço, e no fim, despede-se por se estar a tornar numa das “clakers”, as raparigas de tacão alto da revista em que trabalhava.
A obsessão das pessoas que trabalham no mundo da moda com seu peso está bem presente. As primeiras imagens que vemos são de mulheres a pesarem o pequeno-almoço. A primeira assistente da chefe da revista, está a fazer uma dieta que consiste em não comer e quando está quase a desmaiar, come um quadrado de queijo. Esta diz que para atingir o peso ideal “Só lhe falta uma complicação intestinal”.
Ao olharmos para Andy, vemos uma mulher com peso normal, mas para a moda ela é considerada praticamente obesa. Aliás, neste mundo “(...) o 2 tornou-se o novo 4 (...) e o 6 é o novo 14”. Os estereótipos da moda assim o exigem: para se ser bela, tem de se ser magra, sendo exemplo disso o caso referido no início deste post, a nova Miss Austrália. Mas, embora se pense o contrário, se perguntarmos a alguém do sexo masculino se o seu ideal é ou não o destas mulheres magras, se as acham ou não atraentes, veremos que as respostas não se encaixam neste “ideal” que a maioria das mulheres acha ser o desejável.
Como referido inicialmente, há muitos anos atrás, o ideal de beleza era o da mulher “cheiinha”. Será que esse conceito poderá regressar? Algo que pudéssemos denominar como o “ideal de uma beleza natural”. São de louvar as tentativas de mudança que estão a surgir.
Hmmm...O grande problema é mesmo esse: o de que, mesmo em obras/filmes/séries que, aparentemente, subvertem determinados estereótipos, fazem-no confirmando-os de alguma forma, porque, eventualmente, os que prevalecem são os valores monetários. No caso da Ugly Betty (só posso falar da versão americana, já que a outra não conheço), apesar de incutir uma mensagem extremamente positiva de realização pessoal independentemente de factores que dificultam a integração numa cultura dominante viciada nesses estereótipos, fora da televisão, a promoção da série é feita de forma igualmente conformista - já repararam nas fotografias de promoção da America Ferrara? A cintura dela é irreal e, quando vista com o mínimo de atenção, torna-se óbvia a quantidade de photoshop que ali houve para distorcer as dimensões da actriz (que, se me permitem acrescentar, é tanto mais bonita quanto menos alterações computadorizadas fazem ao corpo dela).
ResponderEliminarE o mesmo se passa com a Anne Hathaway no Devil Wears Prada. Olha-se para ela e vê-se uma rapariga com o peso normal? É uma rapariga com o peso tão normal quanto o é o da Emily Blunt (ou até menos), supostamente a nazi das dietas do filme.
Gostei muito do artigo, mas acrescentava, se me permitem, uma conclusão, em virtude igualmente da vossa análise: estes estereótipos correspondem a um sistema muito bem orquestrado e que foi evoluindo num sentido que me parece absolutamente irreversível. O que aparece nas nossas televisões, mesmo que, à partida, possa deixar antever alguma consciência social, nada tem que ver com isso: em última análise, será sempre ditado por pressupostos monetários e perpetuado por estes. Numa indústria em que as actrizes ganham menos que os actores e, para o fazer, têm que corresponder a tipos específicos de beleza corporal, são as mesmas actrizes que são obrigadas pelas contingências a integrarem esta espiral de superficialidade que são chamadas depois, muito raramente, a fazer parte destes projectos que pretendem subverter o contexto destrutivo em que tão introsadamente se inserem. E nós acreditamos, porque no-lo dizem para acreditar: dizem-nos que a America Ferrara é a feia e nós somos levados a investir emocionalmente na jornada dela (ao mesmo tempo que, fora hipocrisias, nos rimos, também, quando insultam o seu aspecto físico e a sua personalidade); dizem-nos que a Anne Hathaway, neste filme, tem um peso normal, e nós somos levados a acreditar que ela é diferente das outras (quando, noutro filme qualquer, poderia ser ela a beauty queen mazona e a Emily Blunt, a underdog que tenta lutar contra o seu contexto).
Por isso, defendo, em certa medida em resposta ao vosso último parágrafo, que não vão ser os filmes ou as séries que vão algum dia alterar estes estereótipos, mas as discussões, as análises e os artigos que possam ser escritos sobre eles, a deslindar os significados, literais ou subreptícios. Quando formos todos capazes de pensar criticamente o que vemos e ouvimos, terásido dado o primeiro passo para alterarmos o nosso contexto (futuro) de acordo com o mundo em que quereremos viver amanhã.